Controle

Obter o máximo de lucro possível (sempre) é a primeira justificativa para se produzir duas versões cinematográficas e não correlacionadas de um mesmo personagem dos quadrinhos em apenas 5 anos. Mas os dois filmes do Hulk (Hulk, dirigido por Ang Lee em 2003, e O Incrível Hulk, dirigido por Louis Leterrier e atualmente em cartaz) vão além desta questão, embora sempre comece pelo potencial financeiro.

Quando Bryan Singer foi convidado para dirigir o filme dos X-Men e soube que se tratava de heróis mutantes lançando raios pelos olhos e outros super-poderes, quis recusar a proposta. Voltou atrás ao ouvir um produtor dizer que os mutantes eram vítimas de preconceito social e perseguição (Martin Luther King foi citado nesse argumento). Era um potencial dramático eficaz, obviamente sem esquecer das cenas de ação. O filme teve grande sucesso em 2000. Três anos depois, a produção de Hulk seguiu caminho semelhante: convidaram um diretor conhecido pelos seus dramas para dirigir a história do cientista Bruce Banner, um homem cheio de frustrações, e o seu conflito por se transformar em um gigante verde toda vez que se irrita, o que o leva a lidar (às vezes de maneira trágica) com seus traumas diante da figura do pai, da mulher amada, da sociedade. Momentos de ação e destruição também estavam incluídos. Incentivado pelo enorme sucesso de Homem-Aranha, lançado no ano anterior, o filme foi aos cinemas. Não fez o sucesso esperado. Outros personagens fizeram.

De 2000 para cá, mais de quarenta filmes baseados em quadrinhos foram produzidos. É o filão mais lucrativo de Hollywood. Adaptações cinematográficas de quadrinhos quase sempre trazem a certeza do retorno nas bilheterias (qualidade artística é outro campo). Foi essa realidade que possibilitou a Marvel Entertainment, uma companhia norte-americana de entretenimento responsável pelos direitos autorais de vários personagens famosos dos quadrinhos, financiar seus próprios filmes, sem a participação de qualquer distribuidora (o primeiro foi Homem de Ferro). Isso garante mais liberdade e controle na direção dos filmes e, porventura, uma fidelidade maior às revistas, o que deve se converter em bons lucros com a venda de ingressos. Tal empreitada levará ao ambicioso projeto de lançar vários filmes de super-heróis, deixando ligações entre eles até reunir todos em um longa-metragem.

O Incrível Hulk integra este cenário. Evidentemente o interesse maior é de ordem financeira, mas a sua produção faz parte de uma nova fase da Marvel nos cinemas. Muitos personagens da editora (Homem-aranha, Motoqueiro Fantasma, Demolidor) ainda estão sob a custódia de alguns estúdios e, nos cinemas, fazem parte de universos que não se cruzam. Ainda não.

Quanto ao Hulk de 2003, é interessante ver um personagem através de diferentes ângulos. Respeitando os limites éticos, toda liberdade artística é válida, nem que seja para mostrar o que não se deve fazer (como um Motoqueiro Fantasma da vida). Não gostei do filme quando o vi pela primeira vez. E até agora não me agrada muito, um Hulk parecendo feito de chiclete e com uma edição homenageando os quadrinhos que tecnicamente é ótima, mas destoa muito do clima dramático da história. Mas agora vejo melhor suas qualidades. E também entendo com mais clareza porque prefiro O Incrível Hulk: mais do que ser fiel aos quadrinhos (o que já me cativa bastante), gostei de ver que não há sutilezas na raiva e no desespero do protagonista. No fim, acaba ecoando uma velha idéia sentimental: exercemos auto-controle demais; se é pra arrebentar, arrebente de vez. E em grande estilo.

2 comentários:

Anônimo disse...

Acho que quando for assistir o filme eu vou concordar contigo!
Depois de quarta-feira eu falo. :)

Anônimo disse...

Bom poder ler as coisas que tu escreves, bom saber q deste a cara a tapa e te arriscas mais do que apenas a me escrever e-mails ótimos e engraçados... senti falta da tua escrita tão sincera e tão cínica, apesar de um tanto pueril.

Uma grata surpresa quando a Luana me disse do blog... que se tornou ainda melhor ao poder te ler.

Abraços. Temos que nos encontrar qq dia pra beber muitas.

Stephania

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