Garantia

Interessante reconhecer fórmulas e modelos em qualquer segmento da vida. Filmes se destacam nessa parte. Lugares-comuns, clichês, estigmas... Alguns filmes de suspense e terror vão estrear nos cinemas em breve. Resolvi escrever sobre alguns "padrões" que aparecem nesse tipo de história. Evidentemente nada é inédito, já foram descritos com mais antecedência e inteligência em outros lugares. Mas hoje estou com certo ânimo para escrever. Escolhi esse tema. Melhor aproveitar.


Corredores:
paredes próximas são sufocantes, limitam a liberdade de movimentos, o que contribui para o nervosismo do espectador. Mas o principal efeito de angústia é o fato de não poder se desviar do caminho. Não há alternativas a não ser seguir em frente, mesmo que o perigo esteja lá. É a inevitabilidade do confronto ou a impossibilidade da fuga.

Banheiros: lugar-símbolo de privacidade, feito para se sentir à vontade e, portanto, mais vulnerável. Sem roupas, maquiagem, aparelhos de comunicação ou gente por perto. A pessoa só pode contar consigo mesma, conclusão que pode ser reforçada quando a única presença que ela vê é o seu reflexo no espelho. O uso do espelho também simboliza outros dois momentos: a reflexão do protagonista, onde ele toma uma decisão importante para seguir ao clímax da trama, e a impotência da vítima (e do espectador), quando ela vê o que está atrás dela, mas não consegue reagir a tempo. Além disso, banheiros costumam ser ambientes assépticos, onde a cor branca se destaca. Serve bem como cenário para a sujeira e o vermelho do sangue.

Água: geralmente é elemento para vulnerabilidade, assim como o fogo significa perigo. As pessoas saem das ruas quando chove; o corpo fica exposto durante o banho; não se vê o que há atrás das ondas do mar ou sob a superfície do lago. Ao contrário do perigo imediato do fogo, pode-se atravessar a água, mas os movimentos ficam limitados e sempre há a preocupação em não se afogar. Um perigo lento, mas evidente, o que provoca mais angústia. Outra representação que a água pode trazer é o desespero ou a fixação de alguém. Um personagem quando mergulha de roupas no mar para salvar um ente querido ou sai sob uma forte chuva disposto a resolver um mistério expõe o desespero ou a resolução que a cena carrega. É o mesmo princípio que ressalta o efeito romântico de um beijo sob a chuva: é um momento que não pode ser adiado.

Crianças: quando o perigo é sobrenatural, são as primeiras a sentir e a se comunicar com o mal no filme, já que ainda não têm conceitos pré-definidos e estão sempre dispostas a observar o que é estranho. Por essa característica, também costumam representar a influência e o renascimento da calamidade, realizando o contraste entre a fragilidade infantil e o perigo que ela esconde (e também ressalta). Conferem ainda o sentimento de urgência e identificação ao espectador, já que a nossa formação moral e genética sempre nos orienta a proteger os pequenos a qualquer custo.

Mulheres: historicamente sempre simbolizaram a criatura pura e frágil a ser protegida pelo homem. Atualmente elas são mais ativas, fortes e decididas, mas o fato de serem fisicamente mais fracas do que os homens ainda é amplamente usado para aumentar o perigo da ameaça. Acabam funcionando como uma extensão da figura da criança: representam contrastes ao mostrar sua fragilidade (sem exibir passividade) sem deixar de reagir à altura da ação (tanto que geralmente derrotam o antagonista no fim da história). Podendo ser mães, a urgência em proteger a criança é potencializada. E a sensualidade que elas podem trazer serve como contraponto (e também complemento) à angústia do suspense.

Padrões facilmente reconhecíveis. E também muito eficientes, já que ainda funcionam depois de décadas e mais décadas de uso. Às vezes é melhor utilizar velhas fórmulas de maneira elegante do que ser original mas sem ter firmeza para isso. "O Orfanato" é um exemplo bem-sucedido dessa elegância e, principalmente, do sucesso em transmitir o essencial em um filme de horror e suspense: a impotência diante do perigo e a necessidade de enfrentá-lo, mesmo contrariando todas as expectativas de sucesso do mais primitivo instinto animal: a sobrevivência.

3 comentários:

CrápulaMor disse...

Adorei o texto! Terror é, provavelmente, o meu gênero preferido. Ainda não vi O Orfanato, mas um amigo já prometeu que vai gravar pra mim. Pedi pra ele baixar O Inquilino também, da década de 70. Li em algum lugar que é muito bom!

Sara Burle, disse...

Oiii, legal vc ter interferido no meu blog =D. Estou sem internet por causa da mudança e, por isso, tive que deixar o blog um pouco de lado.
Legal a análise que vc fez. Depois vou colocar outras partes da minha monografia. Ela tá linda =D Qual foi o tema da sua? Me manda por e-mail!!!!!! bjs =**********

Lady Sarajevo disse...

Hum... tudo isso e mais um pouco. Sim. Porque nem tudo a gente alcança.
"Padrões facilmente reconhecíveis".
Teu texto é bom, mas eu penso muito relativamente, por isso não gosto de matemática. :D

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