Cem

- Então... centésima postagem, não é isso?

- É.

- Por isso resolveu escrever como diálogo?

- Foi um dos motivos. Não sabia bem o que escrever a respeito, mas queria escrever. E, como já estava ficando de saco cheio do meu próprio texto, achei que escrever em discurso direto poderia ajudar, sem pensar tanto antes de digitar. Pode não ser uma boa saída, pode ficar ridículo, mas incentiva um pouco.

- E com quem está conversando?

- Pois é... o que dizem de um diálogo com uma só voz?

- Seria então apenas sobre você mesmo?

- Haveria outra maneira? Digo, o blog todo é sobre mim. Tentei escrever sobre assuntos variados, sendo objetivo, mas não deixa de ser minha perspectiva. Certo, não há assuntos tão variados assim, mas não há um tema específico, uma linha-chave. Nenhuma novidade até aí.

- E quais foram as últimas novidades?

- Nenhuma. De certa forma, isso me entristece um pouco, mas não é nenhuma surpresa. Percebi que escrevo mais num estado mediano, quando não estou nem muito alegre nem muito triste. Não necessariamente alegria ou tristeza, mas num ponto morno, por assim dizer. Quando nada me empolga ou desanima demais. Mas, além disso, uma hora cansa. Por isso já falei muitas vezes sobre o que leva a ter um blog pessoal, sem objetivo de lucro ou vínculo institucional. Vi algumas coisas, artigos, matérias, outros blogs, compartilhei links. E, pra variar, isso cansou também. Como já me disseram: por que ficar procurando motivo?

- E encontrou alguma resposta ou desistiu de procurar?

- Dei um tempo. Como eu disse, já li e escrevi sobre isso, principalmente quando o blog fez aniversário. Encontrei alguns motivos, mas não necessariamente uma motivação. Podia deixar pra lá, como cheguei a fazer, mas sei que uma hora vou voltar a escrever, nem que sejam velhas abobrinhas. Gosto, fico enjoado, dou um tempo, volto depois e o processo reinicia. Tudo isso sendo afetado pelo tempo disponível e estado emocional. É um círculo. Não é complicado entender.

- Falando assim, parece que já encontrou uma resposta.

- É, percebi isso agora. Já ouvi que tenho uma tendência a complicar questões que, no fundo, não são muito complexas. Minha mãe já disse isso. Até já me disseram que é por isso que não fico tão deslocado ao trabalhar com textos acadêmicos, pelo menos nas Ciências Humanas. Foi uma brincadeira, claro, mas admito que, quando lembro de alguns textos e aulas, especialmente metodologia, penso que tem um fundo de verdade. Mas e daí? Não me orgulho, mas não chega a ser uma condenação moral. Além disso, o blog é de quem? E outra coisa: vi que, justamente por essas perguntas, muitas vezes bobas, é que surgiram textos tão estimulantes, falando não somente de blogs, mas da expressão humana de maneira geral. Toda essa ansiedade é inerente e estimulante à linguagem. Confunde, pode encher o saco, mas faz parte.

- E você acha que já escreveu algum texto estimulante?

- Depende que tipo de estímulo, não é? Se for para estimular a ter um blog próprio, acho que não, até porque nunca tive essa intenção. Se for para ver ou rever alguns filmes, por exemplo, então sim, tive uma ou outra postagem que valeu. Pelo menos eu gosto de reler.

- Então você relê muita coisa do blog?

- Relia mais, principalmente nos dois primeiros anos, quando dava mais atenção ao blog. Mas geralmente não curto muito o que escrevi. Tem uns textos legais, outra parte ruim, quase constrangedora, e a maioria não fede nem cheira.

- Já apagou muitos textos?

- Não. Nenhum, para falar a verdade.

- Mas você disse que tem uma parte ruim do blog. Por que não apagou?

- Para chegar à centésima postagem... Brincadeira. Mesmo lembrando que este diálogo é o texto número 100 do blog, incluindo partes boas e ruins, eu não apaguei nada porque acho que cada postagem se encaixava no contexto que a escrevi. E isso me traz lembranças e, às vezes, ajuda a entender alguma situação atual ou recordar o caminho que fiz até ali. Isso não é muito comum, entretanto. Alguns textos eu não apaguei apenas para me lembrar de não escrever daquele jeito novamente. Aliás, essa própria conversa pode ser um exemplo disso no futuro.

- Sim, você também já falou sobre isso em outros textos do blog. Mas isso não acaba ficando previsível? Digo, é um blog de você para você mesmo. Uma hora você sabe a resposta antes da pergunta, pelo menos nas postagens de caráter mais pessoal. Se você quer um texto ruim ou uma lembrança boa, vai saber onde procurar porque já olhou ali outras vezes, não é? Uma hora isso não deixa de funcionar?

- Você acabou de mostrar a tendência de complicar as coisas. Mais um pouco e talvez até a psicanálise possa oferecer um diagnóstico dessa conversa como uma manifestação do ego e tal... Mas tem razão. Uma hora fica chato e não rende mais. Mas já li e reli, então por que apagar no final das contas? Não sei ao certo. Costumo ler outras fontes para melhorar ou no mínimo mudar as perspectivas. Mas aí veio outra questão: quanto mais eu lia, menos escrevia. Talvez seja um sintoma geral ou não. Comigo acontece. Mas o blog não fica parado por muito tempo por eu estar lendo muito. Tem a ver, mas não é a principal razão. É mais aquilo que disse antes, do círculo de enjoar e voltar. 

- E, no momento, você está enjoado ou na ativa com o blog? 

- Não sei. Há um certo conforto na indefinicão das intenções, não é? Parece um pouco quando nós somos os primeiros a nos censurar, como se a autocrítica tirasse o direito dos outros de apontar nossos erros. Mas aqui eu posso fazer isso, então não sei mesmo.

- Então o centésimo post pode ser o último?

- Improvável, mas talvez seja um dos últimos deste blog. Faz um tempo que penso em ter outro blog para assunto mais específicos. Cinema, adaptações de quadrinhos ou games, crônicas de rpg,  livros acadêmicos, sei lá, uma coisa que me fizesse ser mais objetivo.. E como isso ajudaria minha vontade ocasional de escrever, pode ser que este blog possa aos poucos ir ficando de lado. Talvez trouxesse até um benefício prático para mim, em vez de me fazer ficar matutando sobre questões pseudo-existenciais.

- Se houvesse uma outra pessoa além de você nessa conversa, o que você diria?

- Agradeceria a paciência de quem leu o blog por tanto tempo. Mas isso eu diria se houvesse outra pessoa ou não. É algo que merece ser expresso. Tirando isso, não sei. Que vale a pena escrever, nem que seja para escrever mais daquele jeito. Que os melhores textos costumar ter uma linguagem clara, mas nem sempre isso se aplica a estouros emocionais ou textos de caráter expressamente artístico. Enfim, que é sempre bom tentar melhorar. Nada de novo. Acho que, no fundo, tudo isso quer dizer que a sensação de progresso ou o sentimento de evolução valem a pena, mesmo que não se saiba qual é o topo. Mas com certeza não é o centésimo post de um blog.

3 comentários:

CrápulaMor disse...

Adorei! Muito boa sua entrevista com você mesmo. XD Nunca pare de escrever definitivamente, seus textos merecem ser publicados e lidos. Parabéns pela centésima postagem, uma marca importante na trajetória do blog. Que venham outras centenas.

Obrigado pelas congratulações a respeito do ebook. Espero que você tenha gostado do que leu!

Abraços

Repórter de Sandálias disse...

Parabéns pela centésima postagem, eu ainda estou longe disso! Mas te entendo qnd dizes q, por q queiramos, é quase impossível não falar de si no blog... É como se fosse um espelho ou uma extensão de nós, de nossos melhores momentos, de nossos mais instigantes questionamentos... Além disso, teu post me lembrou o Grande Sertão do Gruimarães, já leste? O romance inteiro é um diálogo de um única voz... Mas o teu post é quase o teu eu conversando com teu eu-lírico, rsrsrsr... Desejo que chegues
à ducentésima postagem: pelo menos uma leitora assídua tu tens ;)

Srta. JATENE, Íris disse...

Então é isso que passa na sua cabeça... rs
Parabéns pelo centésimo!

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