Admiração

Entre muitos casos fascinantes das Olimpíadas da China, minha atenção foi especialmente para a determinação da atleta russa Yelena Isinbayeva no salto com vara. Há muito tempo expõe a sua meta não apenas de ganhar a medalha de ouro, mas estabelecer um novo recorde mundial. Na competição o favoritismo pesava em seus ombros e quando a imprensa questionava as suas chances, ela respondia de forma simpática mas fria, sempre falando pouco, e logo virava o rosto belo e concentrado para fora da pista.

No último dia da prova, a brasileira Fabiana Murer, igualmente determinada e concentrada, não encontra sua vara graças a um erro do comitê de organização do evento. Desconcentra-se e é eliminada da competição. Revolta nos dois lados do planeta. De rosto e olhos molhados, promete não voltar mais à China. No mesmo dia, pouco depois do episódio da vara perdida, Isinbayeva tenta superar o recorde mundial. Precisa saltar 5,05 m. Tenta duas vezes e derruba o sarrafo. Na terceira e última tentativa, consegue atingir seu objetivo. A câmera lenta e de alta definição mostra o movimento do corpo se desviando milimetricamente do sarrafo enquanto o rosto assume a expressão do esforço supremo. Impressionante. Ao cair no colchão, vibra de alegria. Ainda assim, só larga mesmo a seriedade quando a medalha de ouro é pendurada em seu pescoço. Sorri. Chora. Limpa as lágrimas do rosto enquanto a multidão aplaude. É a melhor do mundo no que faz.

Se estivesse lá, também aplaudiria a brasileira e a russa. Revolta e solidariedade, patriótica e humana, pelo erro cometido com Fabiana Murer. Talento inegável, as chances contra Isinbayeva não eram boas, mas teria a chace de tentar com toda a sua capacidade. Uma quebra na sua concentração foi um golpe doloroso e inesperado. Terrível. Palmas para o seu esforço e, acima de tudo, para o seu valor. Quanto à russa, seria a admiração do calor do momento. Uma medalha de ouro legítima merece respeito, não importa a nacionalidade.

Três dias depois e muito longe de Pequim, não dá pra bater palmas. Em vez delas, a admiração segue por este texto. Não é mais pela emoção da disputa ou habilidade atlética. Aqui, nos caminhos alternativos entre trabalho e casa, a atenção vai para a consciência dos objetivos de vida e a submissão à disciplina necessária para alcançá-los. Nas Olímpiadas esse tipo de comportamento é muito perceptível: "quero isso (medalha) e tenho este prazo (4 anos) para conseguir". Fora dos esportes, a visão se anuvia. Pena, mesmo sem surpresa. E até nas Olímpiadas fica claro que os planos e preparos para a vitória podem ser sabotados pelo acaso ou pelas más intenções. Não se pode controlar tudo. Em determinada hora, algo ou alguém faz falta. A concentração se esvai. O ânimo cai. Mas deve-se continuar. Por isso aplaudimos. Para desconhecidos ou para íntimos. Afinal, sempre estaremos em um dos lados: na platéia ou no campo, para emitir ou receber a aclamação. E, quem sabe, em casos mais extremos, as lágrimas.

Um comentário:

CrápulaMor disse...

Muito estranho o que aconteceu com a Fabiana Murer, hein? Depois mostraram que o material dela estava junto com os das eliminadas. Mas quem tirou a vara das coisas dela pra colocar em outro lugar? Sacanagem! No CQC falaram que a vara sumiu, e o Diego Hipólito caiu sentado, tá tudo explicado! hahahahaha que infâme! Os caras são terríveis.

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