Província

Cinema no sábado. O moviecom fez uma reforma: a bilheteria agora fica no corredor da galeria e a entrada é pelo espaço onde era a locadora Cinema 4. Entrega o bilhete ao funcionário desatento, atravessa as cortinas e entra na sala por baixo da tela. Procurando um lugar, vê a maioria dos assentos rasgados, espuma e tecido saltando. "Onde é que tem tanto animal pra fazer isso?". "Em Belém", respondo.

Shopping no domingo. Primeiro a livraria. Pequena, mas ainda existente. Vendo uns livros, alguns me interessam, vou verificar o preço. Passo o código de barras na leitora e nada acontece. Faço de novo. Mais uma vez. Nada do preço. O livro não estava registrado. Pego outro. Nada também. Volto à prateleira. Um livro me chama a atenção e arrisco de novo com o código. Nada. Uma funcionária se aproxima e diz que as leitoras de código não estão funcionando, ela verificaria o preço direto no caixa. Antes fosse direto a mim e avisasse do enfeite das leitoras, antes de me ver brincar com o código de barras três vezes.


A revistaria logo depois. Mangás estavam em outro lugar e sem muitos lançamentos que já tinha visto em outras bancas. Quadrinhos tiveram seu espaço reduzido. Livros de RPG também. Auto-ajuda e horóscopo ganharam mais terreno. E muitas, mas muitas revistas danificadas. Vi revistas sobre uma superfície irregular e sob grande peso, amassadas ao meio. Havia exemplares que ficavam na direção da saída do ar refrigerado, capa e primeiras folhas balançando. Alguém prendeu apenas a metade inferior desses exemplares para que não dobrassem com o vento refrigerado, fazendo com que ficassem com "orelhas" nas pontas. Mais de uma vez, arrumei blocos da mesma revista para poder ver se havia alguma coisa debaixo deles. Nada achei, a não ser mais blocos desorganizados de outras revistas.

Decidi gastar. Em frente à revistaria, um café. Caro, mas eu estava com vontade. Peguei a nota e fui pro balcão. A moça era lenta. Pior: lenta e sorridente. Olhei a nota e vi que especificava o que havia pedido: capuccino sem chantilly e esfirra de frango. Ela pegou a nota. Não sorriu. Conversava com as colegas de trabalhos. Sorrindo. Houve um momento em que ela ficou parada com o bule na mão ouvindo algo que a fez rir. Não prestei atenção, mas sinceramente duvido da graça: além de confirmar que era sorridente sem causa, já desconfiava que era estúpida. Perguntou duas vezes se era com ou sem chantilly. Duas vezes perguntou se era esfirra de carne ou frango. Ela já tinha visto a nota do pedido. Respondi a tudo, inclusive quando ela perguntou se eu preferia açúcar ou adoçante (óbvio que ela não usou o verbo "preferir", limitando a dizer as duas opções). Quis açúcar. Disse duas vezes. Veio a bandeja com o adoçante. Antes de recebê-la, peguei o frasco de Zerocal e o deixei sobre o balcão. Silêncio. "Ah, é açúcar, né?". Lerda. Teria que ouvir também duas vezes para entender se a chamasse assim. Sentei e comecei a comer. Carne. Boa. Fui vencido.


Hoje no trabalho. Minha chefe é de São Paulo. Chegou aqui em dezembro de 2006. Perguntei o que ela tinha a dizer de Belém nesse tempo. "Não entendo esse tratamento com o cliente aqui, esse negócio de ligar em cima da hora e dizer que não dá pra fazer o serviço. Isso não acontece em São Paulo... não acontece! Lá eles sabem que têm que fazer isso porque senão sempre tem outro que faz no seu lugar e também porque sabem que a reputação e confiança deles fica em jogo no mercado". Bebo o refrigerante, sentindo um misto de alívio e pressão sobre mim.

Reputação. Tratamento. Parece evidente demais dizer: Belém é um lugar de atendimento ruim, de descaso com o cliente, de uma cultura de "é assim mesmo". Por que a supresa da idéia geral de que o que vem de fora é melhor? Detalhes obrigatórios se tornam luxos, entre eles o bom atendimento e a confiança no prazo. Claro que há exceções. Sempre há. Não é uma cidade grande, não é um lugar de muita variedade. São relações e esquemas no mercado. Mas não é muito difícil perceber o caminho entre evolução e apodrecimento. Todos se conhecem. Deviam se lembrar disso na hora de dar pra trás. Sempre se pode divulgar um resultado com eficiência nessa cidade (especialmente os envolvidos com Comunicação), sempre se pode fazer elogios ou jogar lá embaixo o nome. Palavras se espalham. Pena que o mesmo não se aplique à justiça delas.

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